Morreu hoje, em Lisboa, vítima de doença prolongada, a cantora cabo-verdiana Celina Pereira, que foi uma das impulsionadoras da ideia que levou o Governo de Cabo Verde a propor à Unesco a classificação da morna como Património Imaterial da Humanidade.

O deseparecimento fisico de Celina Pereira deu-se hoje, nove anos depois da morte de Cesária Évora, outra figura da cultura cabo-verdiana.

Há muito que a cantora se encontrava com a saúde debilitada, tendo sido internada num dos hospitais de Lisboa, devido à uma descompensação respiratória.

Depois de adoecer, Celina Pereira permaneceu no lar de idosos da Santa Casa da Misericórdia, onde hoje faleceu. 

Em 2016, representou a lusofonia no Festival Music Now, que decorreu em Atenas.

Celina Pereira, natural da ilha da Boa Vista, herdou a veia artística da família. O seu avô paterno, pai de 17 filhos e padre católico, era filólogo, poeta, músico e pintor. Aos seis anos, seguiu com a sua família para a ilha de São Vicente e teve uma cultura vasta em relação às músicas de Cabo Verde, algo que fez questão de passar às novas gerações. Também era contadora de histórias.

Aos oito anos, começou a cantar como solista do orfeão, na igreja protestante. Seguiu-se o “Eden Parque”, no Mindelo, e os seus Serões para Trabalhadores, sempre às escondidas do pai.

A sua primeira actuação profissional foi em 1968, com 25 anos, a convite do Grupo Ritmos Cabo-Verdianos, e seguiram-se os convites do cantor Bana para actuações nos saraus que organizava.

Em Portugal, a sua primeira actuação na televisão foi no programa “Arroz Doce”, de Júlio Isidro, onde conheceu Eunice Muñoz e Marina Mota que actuavam como residentes. Isto, por ocasião da promoção do disco “Mar Azul – Cantá Mudjers”, resultante do 1º Festival de Vozes Femininas, organizado pela OMCV – Organização das Mulheres de Cabo Verde.

Figura culta da sociedade cabo-verdiana, Celina Pereira também se preocupava com a preservação da memória colectiva e da identidade do povo cabo-verdiano. O seu primeiro ‘single’ “Bobista, Nha Terra / Oh, Boy!”, foi editado em 1979, mas só em 1986 lançou o primeiro disco “Força di Cretcheu” (Força do Meu Amor), que inclui histórias e cantigas de roda, brincadeira, casamento e trabalho.

Assim, desde o seu primeiro LP “Força di Crêtcheu”, tentou recuperar a riqueza e a diversidade da cultura musical do povo cabo-verdiano.

Com pesquisas e recolhas efectuadas em Cabo Verde e na diáspora cabo-verdiana, Celina Pereira foi responsável por recuperar mazurcas, cantigas de casamento e mornas, cantigas de roda, lunduns, choros, lenga-lengas e toadas rurais e possibilitado a salvaguarda destes temas para a posterioridade.

Também actuou na comunicação social como jornalista de rádio e contadora de estórias, actividade que iniciou em liceus e escolas de Boston, Massachussets, USA, desde 1990.

Em 1990 lançou o LP “Estória, Estória… No Arquipélago das Maravilhas”, altura em que começou, paralelamente, a “actividade” de contadora de estórias sobre o imaginário cabo-verdiano.

Três anos depois, em 1993, surgiu o álbum “Nós Tradição” e, em 1998, deu corpo a “Harpejos e Gorjeios” e iniciou também uma série de duetos com artistas como o fadista Carlos Zel e o brasileiro Martinho da Vila.

“Estória, Estória? do Tambor a Blimundo”, lançado em 2004, e alvo de várias reedições desde então, é um áudio-livro que pretende recuperar o património expressivo das histórias e jogos de roda tradicionais africanos.

Devido ao seu trabalho na preservação, pesquisa e divulgação da cultura cabo-verdiana, em vida, a cantora foi alvo de várias homenagens. Celina foi distinguida no festival de música “Sol da Caparica”, pela Câmara Municipal de Almada, em Portugal, que lhe atribuiu a medalha de prata de Mérito Cultural pelo seu empenho na divulgação das artes e pela sua dedicação às causas sociais.

Em 2003, foi condecorada pelo então Presidente português Jorge Sampaio, com a medalha de mérito (grau de comendadora) pelo seu trabalho na área da educação e da cultura cabo-verdiana.

Em 2014, foi galardoada com o Prémio Carreira na 4.ª edição do Cabo Verde Music Awards (CVMA). Em 2019, recebeu uma homenagem de músicos e amigos através de uma serenata, no espaço B.Leza, em Lisboa, e no mesmo ano foi homenageada na segunda edição da gala “Noite de Autores” promovida pela Sociedade Cabo-verdiana de Música (SCM).

Em Março de 2019, também foi apresentado o livro infantil da escritora e cantora Celina Pereira “A Sereia Mánina e seus sapatos vermelhos”, o mais recente livro infantil da escritora e cantora Celina Pereira, em formato impresso na Biblioteca Nacional, na cidade da Praia.

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